A displasia do desenvolvimento dos quadris (DDQ) é uma condição que afeta a formação da articulação do quadril em bebês e crianças pequenas. Essa condição pode variar de uma leve alteração da profundidade do encaixe na bacia (displasia do acetábulo) até um deslocamento completo. Entender a DDQ é crucial para pais e responsáveis, pois o diagnóstico precoce e o tratamento adequado podem prevenir problemas graves a longo prazo.
O que é displasia do desenvolvimento dos quadris?
A DDQ ocorre quando a articulação do quadril não se desenvolve adequadamente. Normalmente, a cabeça do fêmur se encaixa perfeitamente na cavidade acetabular da pelve, formando uma articulação estável. O nome antigo desta patologia era luxação congênita do quadril, entretanto, com a possibilidade de seu desenvolvimento após o nascimento (especialmente no primeiro ano), esta denominação passou a ser displasia do desenvolvimento do quadril.
Existem diferentes graus de DDQ: (fig.1)
• Luxação: O fêmur está completamente fora da cavidade acetabular.
• Instabilidade: O fêmur pode ser movido facilmente para fora da cavidade acetabular, através de manobras especiais realizadas durante o exame físico.
• Displasia acetabular: O fêmur encontra-se completamente dentro da cavidade acetabular, porém esta apresenta profundidade diminuída.
Fig. 1
Causas e fatores de risco
A DDQ pode ser causada por uma combinação de fatores genéticos e ambientais. Alguns fatores de risco incluem:
• História familiar: Bebês com parentes de primeiro grau que tiveram DDQ têm maior probabilidade de desenvolver a condição.
• Posicionamento intrauterino: Bebês que estavam em posição pélvica (sentados com as nádegas para baixo) têm maior risco.
• Gênero: Meninas são mais propensas a ter DDQ do que meninos.
• Primeira gravidez: A primeira gravidez pode ter um risco maior provavelmente devido ao útero ser mais apertado, limitando o movimento do bebê.
Existem também estudos que relacionam a DDQ com o hábito de enfaixar os membros inferiores dos bebês, de forma a limitar seus movimentos.
Quadro clínico:
Os sinais de DDQ podem ser sutis, especialmente em recém-nascidos, assim é necessário ter alto grau de suspeita em bebês com fatores de risco.
Alguns sinais a serem observados incluem:
• Assimetria nas dobras das coxas e/ou glúteas: Diferentes alturas ou profundidades das dobras da pele nas coxas e região glútea. É importante ressaltar que estas assimetrias podem estar presentes em crianças que não apresentam DDQ.
• Limitação de movimento: Ao exame clínico existe limitação da amplitude do movimento de separar as coxas (abdução). Este achado é mais frequente em casos de luxação completa ou em crianças mais velhas.
• Caminhar mancando: achado principalmente em crianças mais velhas com DDQ unilateral. Nos casos bilaterais, estas crianças mostram andar característico.
Diagnóstico:
O diagnóstico é frequentemente realizado por meio de um exame físico rotineiro pelo pediatra e/ou ortopedista pediátrico. O teste de Ortolani (fig.2) e o teste de Barlow são manobras utilizadas para detectar a instabilidade do quadril em recém-nascidos. Se houver suspeita de DDQ ou em bebês com fatores de risco, ultrassonografias
do quadril devem ser solicitadas. Em bebês abaixo dos 6 meses, devido à ausente ou pequena ossificação do quadril, raios x podem ser pouco elucidativos. É importante ressaltar que em alguns casos, a primeira ultrassonografia realizada em bebês com exame físico normal, antes das seis semanas de vida, pode mostrar alterações leves – padrão imaturo, não configurando anormalidade como fator isolado.
fig.2
Tratamento
O tratamento para DDQ depende da idade da criança e da anormalidade presente no quadril. As opções incluem:
• Uso de órteses: Para bebês com menos de seis meses, o suspensório de Pavlik (fig. 3) é o mais frequentemente utilizado para manter o fêmur na posição correta enquanto a articulação se desenvolve. Ele pode ser utilizado em quadris instáveis ou luxados (nestes visando o posicionamento da cabeça femoral dentro do acetábulo – chamada redução) ou com displasia acetabular. Nos casos de quadris luxados, se a redução não for alcançada em até duas semanas, outra alternativa de tratamento deve ser implementada.
Fig. 3
• Gesso pelvipodálico: Em casos em que o suspensório não é eficaz, um gesso pode ser aplicado para posicionar o quadril corretamente. O gesso também está indicado para casos em que o diagnóstico foi feito após os 8 meses de vida. Ele é colocado sob anestesia geral, em alguns casos requer o alongamento cirúrgico concomitante de músculos adutores do quadril para facilitar o posicionamento.
• Cirurgia: Em casos com diagnóstico tardio (após 18 meses de vida), pode ser necessária uma intervenção cirúrgica para realinhar e estabilizar a articulação. A cirurgia pode ser apenas de partes moles ou incluir a parte óssea, do fêmur e/ou acetábulo.
Importância do diagnóstico precoce
O diagnóstico precoce é fundamental para garantir o sucesso do tratamento. Bebês diagnosticados e tratados nos primeiros seis meses de vida têm uma alta taxa de sucesso com métodos não cirúrgicos. Sem tratamento adequado, a DDQ pode levar a problemas a longo prazo, como alterações no caminhar, artrite degenerativa precoce, diferença no comprimento das pernas e dor crônica.
Prevenção e cuidados
Enquanto não há uma maneira definitiva de prevenir a DDQ, algumas medidas podem ajudar a minimizar os riscos:
• Informação e conscientização: Estar ciente dos fatores de risco e sinais da DDQ pode ajudar os pais a suspeitar do diagnóstico e procurar tratamento mais rapidamente.
• Monitoramento de bebês com fatores de risco: É a medida mais importante. Na vigência de fatores de risco o bebê preferencialmente deve ser avaliado por ortopedista pediátrico e mesmo que o quadril não mostre alterações no primeiro exame, deve ser realizada ultrassonografia com 6 semanas de vida.
• Enfaixamento: Evitar enrolar o bebê de forma que restrinja o movimento dos quadris e membros inferiores.
Conclusão
A displasia do desenvolvimento dos quadris é uma condição tratável, especialmente quando diagnosticada precocemente. Como mães, é vital estarem atentas aos fatores de risco e sinais, bem como manter um diálogo
aberto com os profissionais de saúde. Com o tratamento adequado, a maioria das crianças com DDQ pode levar uma vida ativa e saudável.
Dra. Ana Paula Tedesco, Mestre em Ortopedia e Traumatologia, Honorary Research Fellow Ortopedia Pediátrica e Neuro-ortopedia pela Northewestern University de Chicago
www.anapaulatedesco.med.br