Meninas de rosa, meninos de azul. Meninas brincam com bonecas e fogõezinhos; meninos, com carrinhos e bolas. Nas escolas, filas de meninas e filas de meninos. No cotidiano, frases como: “senta direito, isso não é jeito de menina”, “homem não chora!”. Temáticas de gênero são poucas discutidas nas escolas, clubes e dentro de nossas famílias. Como abordar esse tema?
Facilmente encontradas no cotidiano e naturalizadas por grande parte das pessoas, todas essas situações são carregadas de estereótipos que reforçam o que é ser mulher e o que é ser homem em nossa sociedade e acabam por desrespeitar a individualidade e as preferências de cada criança.
Por uma relação de igualdade
Em uma mesa de debate, os especialistas da Plan Internacional Brasil – Viviana Santiago, gerente técnica de gênero, Flávio Debique, gerente de proteção infantil e incidência política -, e a professora de educação infantil Tathiana Passi discorreram sobre os desafios colocados para que as relações de gênero se deem em uma condição de igualdade.
Eles também reforçaram a importância do enfrentamento se dar já na primeira infância para romper com a lógica adultocêntrica que invisibiliza o reconhecimento das meninas e naturaliza as violências nos cotidianos delas. Isso se torna ainda mais urgente quando se consideram os dados relativos ao Brasil: estima-se que meio milhão de mulheres são vítimas de estupro por ano, e que dois terços das vítimas são meninas menores de 13 anos, cerca de 330 mil.
Para Viviana, a luta passa pelo enfrentamento do patriarcado que nada mais é do que uma construção social que se baseia no domínio do gênero masculino sobre outros gêneros. “As diferenças são fruto dessa determinação. O patriarcado forja mentes, corpos, ideias, posturas, há uma norma colocada e aceita pela sociedade que precisa ser discutida”, observou.
Para Debique, um dos caminhos é evidenciar a situação de desvantagem de meninas e mulheres para fazer com que, uma vez cientes de que são portadores de privilégios, os homens possam abrir mão deles em nome da igualdade.
“Um mundo bom para as meninas é um mundo bom para todo mundo”, colocou Debique reforçando que a masculinidade predominante também não é boa para os homens. Na visão de Viviana, mesmo para os meninos a masculinidade é predatória: “experimente ser homem e não gostar de futebol, por exemplo; ou ainda ser homem e gostar de outro homem”, provocou a especialista.
A escola como espaço de enfrentamento
Outra questão suscitada foi a importância que esse debate seja levado para dentro das escolas, espaços que cotidianamente reforçam a desigualdade entre meninos e meninas, a começar pelo currículo, na opinião de Viviana.
“Ele reitera a história dos homens como autores, personagens. Se conta a história como se eles fossem os heróis. Ou seja, o gênero já está lá, nas escolas. Vejam só como estudamos Joana D’arc, por exemplo: muito mal e ainda tratando-a como louca. A história cuidou também de invisibilizar ou descreditar essas mulheres”, condenou a especialista.
Nas instituições escolares, o desafio também passa pelos professores, permeados por todas as questões machistas presentes na sociedade. Tatiana colocou que teve que se desconstruir como educadora antes de começar a trabalhar com as crianças.
“Precisamos, entre outras coisas, ter consciência de que quando um exercício traz em seu enunciado que João tem 3 carrinhos e Maria 5 bonecas ele está tratando de gênero”, observou.
A docente também colocou que o acesso a materiais pedagógicos sobre o tema ainda são uma dificuldade, bem como conseguir diálogo com as escolas e famílias devido à resistência. “Sinto falta de articulação, de uma rede que aproxime as pessoas que de fato abraçam essa problemática e estão dispostos a enfrentá-la”, sentenciou.
A campanha
Para incentivar o debate sobre igualdade de gênero, a campanha Desafio pela Igualdade se propõe a fornecer dados, provocações e reflexões para que todos possam ser agentes e multiplicadores da causa.
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