A dor de cabeça em crianças é um problema significativo na área de saúde pediátrica. Cerca de 40% das crianças aos 6 anos de idade relataram já terem tido dor de cabeça. Com o aumento da idade esse índice pode chegar entre 70 e 90% de acometimento em adolescentes, segundo estudos epidemiológicos. As dores de cabeça envolvem fatores complexos e interconectados que vão desde aspectos psicológicos e de qualidade de vida até questões neurológicas.
Estudos apontam que as dores de cabeça primárias, são as mais comuns e destacamos as enxaquecas e cefaleias tensionais, que podem variar de moderada à grave na infância.
A enxaqueca é uma crise recorrente de dor de cabeça caracterizada por dor pulsante, localizada na frente e dos dois lados da cabeça da criança (no adulto pode ser de um lado só), e acompanhada de sintomas como náuseas, vômitos, fonofobia, fotofobia, distorções visuais (aura), e que piora quando a criança faz qualquer atividade física simples como caminhar. Um dos sinais que chamam a atenção é quando a criança evita claridade ou tapa os ouvidos numa inconsciente ação contra o desconforto. Outros sintomas também correlacionados são dores abdominais.
A cefaleia tensional é o tipo mais comum de dor de cabeça primária em todas as faixas de idade. Marcada por uma pressão mais leve, não apresenta sintomas como vômitos, e não impede a criança de fazer atividades como a enxaqueca. Ela costuma ser mais periódica, quase diária, e tem fatores psicológicos associados com mais frequência.
Já as cefaleias secundárias são causadas a nível de SNC, em áreas próximas ou relacionadas a doenças sistêmicas. Nestes casos mais graves podem ter relação com tumores, infecções (como meningite, sinusites e traumas) ou hemorragias.
A relação entre dores de cabeça e comorbidades, como distúrbios de ansiedade, depressão e problemas de sono, também é evidente. Crianças que sofrem de enxaquecas, por exemplo, têm uma probabilidade significativamente maior de apresentar transtornos de ansiedade, sugerindo uma necessidade de abordagens que combinem suporte médico e psicológico. Além disso, problemas de sono são comuns em crianças com dores de cabeça crônicas, com dificuldades como insônia, distúrbios do ritmo circadiano e até parasomnias, como sonambulismo e terrores noturnos. Essa inter-relação sugere que a regulação do sono pode ser um componente crítico no tratamento e controle das dores de cabeça infantis.
Apesar dos avanços nas pesquisas, a falta de uniformidade nos métodos de diagnóstico e nos critérios de avaliação dificulta comparações precisas entre estudos. Muitos estudos dependem de questionários preenchidos pelos pais, o que pode introduzir vieses na avaliação. A International Classification of Headache Disorders (ICHD) é uma ferramenta de diagnóstico amplamente utilizada, mas sua aplicação em estudos pediátricos ainda enfrenta desafios devido à dificuldade de adaptação aos sintomas específicos de crianças. Sabemos que o importante é que seja feita uma anamnese detalhada incluindo a quanto tempo a criança vem tendo dor de cabeça, se é de forma aguda ou crônica, qual a duração, quais horários e dias mais frequentes, se fatores como barulho, estresse, sono., fome, excesso de luz entre outros são sinais de piora. O que parece melhorar como comer, se deitar, ficar no escuro… Importante ressaltar que problemas de visão e infecções respiratórias como sinusites não são relacionadas a dores de cabeça crônicas. Exames de imagem como tomografia de crânio podem ser solicitados por pediatras e neuropediatras especialmente quando se desconfia de cefaleias secundárias.
O tratamento das dores de cabeça primárias deve se basear inicialmente em técnicas de relaxamento, higiene do sono, orientação psicológica para a criança e família. Também sugerimos atenção a uma rotina com horários e atividades organizadas. Garantir que as refeições sejam bem-feitas, com intervalos adequados para evitar picos de hipoglicemia. Evitar alimentos como embutidos e alimentos ricos em gordura. Reduzir o uso de telas. Promover atividades físicas que ajudem na regulação de estresse. Em casos em que se diagnostica que a dor de cabeça é tensional, um odontopediatra experiente ou um especialista em dor orofacial/distúrbio de articulação temporomandibular, podem indicar o uso de placa miorrelaxante, principalmente para adolescentes. As placas ou aparelhos quando confeccionadas de material rígido como o acrílico tem se mostrado bastante eficientes no controle da dor de cabeça tensional.
O impacto na qualidade de vida das crianças e adolescentes que sofrem com cefaleias e enxaqueca é considerável, afetando seu desempenho escolar, vida social e bem-estar psicológico e deve ser investigado por uma equipe transdisciplinar a fim de diagnosticar as causas e encontrar o melhor tipo de tratamento.