A infertilidade masculina é definida como a incapacidade de engravidar a parceira após 1 ano (12 ciclos menstruais) de relações sexuais freqüentes, não protegidas, ou seja, sem uso de qualquer método contraceptivo. Não confundir com esterilidade, que é definida como a incapacidade definitiva de engravidar a parceira.
Cerca de 15% dos casais são inférteis. O fator masculino contribui, isoladamente, em 30% dos casos. Uma combinação de fatores masculino e feminino existe em 20% dos casos. Portanto, o fator masculino contribui para a falência reprodutiva em 50% dos casais inférteis.
Muitos fatores influenciam a fertilidade de um casal: idade do homem, idade da mulher, freqüência e técnica do coito, uso de lubrificantes vaginais, passado de doenças sexualmente transmissíveis, exposição a produtos tóxicos ambientais ou a certos medicamentos, coexistência de algumas doenças, várias causas específicas de infertilidade e outras tantas desconhecidas.
Antes de prosseguirmos, uma breve explicação da função reprodutora masculina: hormônios produzidos por uma região do cérebro (hipotálamo), estimulam uma glândula na base cerebral (hipófise), que por sua vez, estimula os testículos a produzirem o hormônio masculino testosterona que estimula e regula as células germinativas a produzirem espermatozóides.
Estes são armazenados e amadurecidos nos epidídimos (estruturas contíguas, anexas aos testículos). Dos epidídimos, os espermatozóides são conduzidos por dois longos e delgados condutos, os ductos deferentes (um de cada lado) até as vesículas seminais, onde são misturados com sua secreção e desembocam na próstata, onde também se misturam com sua secreção. Neste ponto, os espermatozóides mais a secreção das vesículas seminais mais a secreção prostática formam o sêmen que, antes de se exteriorizar com a ejaculação, ainda recebe uma pequena contribuição das secreções da uretra.
Portanto, várias enfermidades ou condições que acometem desde o cérebro até a uretra, podem ser responsáveis pelo comprometimento da fertilidade masculina. Qualquer fator responsável por alterações que dificultem ou impeçam a produção adequada das células germinativas, tem como conseqüência uma diminuição ou abolição da capacidade fértil.
Eis uma divisão didática para as principais causas de infertilidade masculina:
1- Enfermidades do hipotálamo e hipófise
Quaisquer enfermidades ou condições clínicas, tanto congênitas quanto adquiridas, que atinjam o hipotálamo e/ou a hipófise, poderão comprometer a secreção normal dos seus hormônios, que, consequentemente, afetarão adversamente a função testicular.
Portanto, no âmbito do hipotálamo/hipófise, doenças de origem genética, tumores, mal formações, inflamações, degenerações, traumatismos externos ou cirúrgicos, aneurismas, infartos, excesso de androgênios (hormônios masculinos) por uso de anabolizantes ou administrados terapêuticamente, doenças sistêmicas como diabetes, hipotiroidismo ou obesidade severa, desencadearão uma condição clínica chamada hipogonadismo, ou seja, função testicular diminuída ou abolida.
2- Enfermidades primárias dos testículos
Enfermidades primárias dos testículos são responsáveis por cerca de 35% das causas de ausência de espermatozóides no ejaculado ou alteração importante da qualidade do sêmen. Vários são os fatores responsáveis:
A) Síndrome de Klinefelter, uma anomalia congênita, com repercussões na esfera testicular, em que o cromossomo sexual é defeituoso.
B) Criptorquidia, outra anomalia congênita, em que um ou ambos os testículos não migram para a bolsa escrotal, permanecem aprisionados em algum lugar da cavidade abdominal, durante o desenvolvimento fetal. Os testículos não-descidos possuem alterações que dificultam ou impedem a produção adequada das células germinativas, os espermatozóides.
C) Varicocele, uma enfermidade das veias do escroto. Nada mais que varizes escrotais, ou seja, dilatações venosas que dificultam o retorno do sangue, fazendo com que este fique acumulado nas veias escrotais, dificultando o resfriamento testicular, já que as veias varicosas, ao permitirem o acúmulo sangüíneo, aumentam a temperatura testicular, o que é prejudicial à formação dos espermatozóides. Varicoceles costumam ocorrer na puberdade e são muito mais comuns do lado esquerdo. Nem todos que possuem varicoceles são inférteis, embora a varicocele seja a causa tratável mais comum de infertilidade.
D) Defeitos do cromossomo Y, ou seja, alterações da forma e constituição deste cromossomo sexual. Enfermidade detectada apenas em sofisticados testes de laboratório, acomete cerca de 20% dos homens inférteis. O defeitos do cromossomo Y provocam alterações que dificultam ou impedem a produção adequada das células germinativas.
E) Orquites virais, são infecções secundárias dos testículos, geralmente após um foco à distância. Um dos mais comuns é a parotidite (caxumba). Dos homens acometidos de caxumba, cerca de 20% desenvolvem orquite, de um ou ambos os lados. Destes, alguns terão como conseqüência a destruição das células germinativas, incapacitando a produção futura de espermatozóides.
F) Orquiepididimites, infecções dos testículos e epidídimos, em conseqüência de doenças sexualmente transmissíveis, geralmente causadas por bactérias, dentre elas, a Chlamydia e o gonococo (gonorréia). Estas infecções poderão destruir as células germinativas ou obstruir os epidídimos.
G) Intoxicação ou uso crônico de algumas substâncias como maconha, cetoconazol, cimetidina, antiandrogênicos, drogas antineoplásicas (quimioterapia para tumores malignos) podem ser responsáveis pela produção anormal tanto de espermatozóides quanto de testosterona pelos testículos. Exposição a agentes de contaminação ambiental como pesticidas, metais pesados etc., causam efeito semelhante.
H) Radiações ionizantes, das quais os raios X são o representante mais conhecido, podem comprometer ou impedir a produção de espermatozóides, dependendo da dose a que o paciente se expôs.
I) Hipertermia, ou seja, exposição prolongada dos testículos a altas temperaturas, como o que ocorre com os freqüentadores de saunas ou apreciadores de banhos quentes de imersão, bem como nas varicoceles, afeta adversamente a produção dos espermatozóides.
J) Anticorpos anti-espematozóides, ou seja, anticorpos que atacam e destroem as próprias células reprodutivas, podem ocorrer espontaneamente ou como conseqüência de alguma agressão testicular.
L) Traumatismos diretos, acidentais ou cirúrgicos sobre os testículos ou epidídimos, poderão comprometer a produção dos espermatozóides, por destruição da massa testicular ou afetar a permeabilidade ou função dos epidídimos.
M) Torção do cordão espermático, ou seja uma urgência urológica de início súbito, ocorre quando o cordão espermático dá voltas sobre seu próprio eixo, estrangulando a circulação sangüínea testicular, o que provoca, se não for reparada a tempo, morte das células germinativas.
N) Enfermidades crônicas debilitantes, ou seja, uma série de doenças que afetam o organismo como um todo, podem comprometer a função testicular. Como exemplos, podemos citar a desnutrição, anemia falciforme, cirrose hepática e insuficiência renal.
3- Alterações do transporte do espermatozóide
Os epidídimos desempenham importante papel no amadurecimento e transporte dos espermatozóides. Os condutos deferentes dão prosseguimento a este transporte e conduzem os espermatozóides desde os epidídimos até a uretra, de onde são ejaculados. É obvio que qualquer alteração nesta cadeia de eventos comprometerá a fertilidade. Vejamos:
A) Anormalidades dos epidídimos
Distúrbios da função epididimária de concentrar, amadurecer e transportar os espermatozóides, podem ocorrer devido a ausência congênita ou adquirida dos epidídimos, alterações do funcionamento normal destes ou obstrução, ocasião em que mesmo que haja produção normal de espermatozóides pelos testículos, estes ficariam retidos nos epidídimos ou não amadureceriam adequadamente, comprometendo a fertilidade.
B) Anormalidades dos ductos deferentes
A ausência congênita ou adquirida dos ductos deferentes, alterações da sua capacidade de impulsionar os espermatozóides ou sua obstrução, inclusive após vasectomia, impedirão o correto transporte dos espermatozóides até a uretra. A ejaculação resultante é pobre em ou não contém espermatozóides, apenas os fluidos da próstata e vesículas seminais.
C) Disfunções ejaculatórias
Distúrbios hormonais, diabetes, lesões dos nervos da medula ou pélvicos, cirurgias pélvicas, distúrbios da próstata, são causas conhecidas que poderão fazer com que o paciente não ejacule ou o faça em direção contrária, para dentro da bexiga, não conseguindo, portanto, depositar o esperma na vagina da parceira.
Disfunção erétil peniana, ejaculação precoce, uso de diafragmas e preservativos também são fatores contribuintes para infertilidade masculina.
4- Fatores desconhecidos
Em um número razoável de homens inférteis que apresentam baixa qualidade do sêmen, apesar de exaustiva investigação, não se consegue descobrir uma causa que justifique tal condição. Além disso, existem homens que apesar de várias análises seminais normais, não conseguem engravidar uma parceira aparentemente fértil.
Portanto, como vimos, o assunto é extenso e complexo, o que requer estudos multidisciplinares para que se possa atuar com certeza, decisão e segurança para investigar e tratar adequada e satisfatoriamente uma condição que gera muita ansiedade além de ser muito frustrante para seu portador. O primeiro passo para um tratamento bem sucedido e a conseqüente gravidez da parceira, é o correto diagnóstico da situação. Muitas causas de infertilidade masculina podem ser corrigidas; outras, apesar da impossibilidade, poderão ser contornadas com diversos métodos disponíveis de fertilização em laboratório.