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Quando se deve começar a alfabetizar uma criança?

Tempo de Leitura: 7 minutos
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A questão sobre a idade ideal para alfabetizar uma criança tem sido alvo de intensos debates há muitos anos. Da mesma forma como permanece ainda hoje ativa a questão sobre quais os conteúdos a serem ensinados na Educação Infantil. Há pelo menos 30 anos o debate pendia mais para a resposta de que se deve alfabetizar apenas quando a criança entra no Ensino Fundamental, por volta dos 7 anos, principalmente por questões de desenvolvimento baseadas na teoria piagetiana ou em crenças populares. No entanto, é necessário responder esta questão com base nas mais recentes evidências científicas e não apenas com proposições ideológicas ou desatualizadas.

Atualmente, acumulamos um grande corpo de evidências científicas acerca dos processos de ensino e de aprendizagem da linguagem escrita. Esses resultados de pesquisas, brasileiras e estrangeiras, nos mostram que a aquisição das habilidades de leitura e de escrita é um processo que começa muito precocemente ainda nos primeiros anos de infância. Por esta razão advogo em favor da importância do papel de uma Educação Infantil de qualidade que garanta essas habilidades básicas para a alfabetização.

Dentre as proposições que são contrárias ao ensino de leitura e de escrita na Educação Infantil, muitas delas encontram respaldo em teorias antigas (desatualizadas) e conhecimento não científico de base mais mítica do que empírica. Aliás, é preciso deixar claro que não se trata exatamente de ensinar a ler e a escrever na Educação Infantil, mas sim de ensinar habilidades que são pré-requisitos para a alfabetização no Ensino fundamental. Essas habilidades podem facilitar a aprendizagem da leitura e da escrita no Ensino Fundamental, além de que existem evidências de que tais habilidades são capazes de diferenciar os bons leitores dos maus leitores mesmo no final do ensino fundamental.

Um ponto de partida essencial é entender que o pré-requisito fundamental para aprender a ler e escrever é ter o domínio da linguagem oral. Qualquer leitor que aprendeu a ler em português conhece também o alfabeto Inglês (já que é o mesmo), mas nem por isso pode entender textos em inglês se não sabe falar em inglês (não aprendeu a fonologia do inglês). É preciso, portanto, reconhecer que a linguagem escrita representa, isto é, registra a linguagem falada. De tal modo, que quando as crianças entram na Educação Infantil, aos 4 ou 5 anos, elas já estão dominando um importante pré-requisito que é a linguagem oral.

Dessa forma, pode-se perguntar quando se começa a aprender a ler e escrever? De certo modo, desde os primeiros momentos em que nascemos, quando já começamos a ser expostos a nossa língua materna (aliás existem evidências de que mesmo ainda durante a gestação já temos influências dos sons da nossa língua), quando somos expostos a letras, a nomes escritos, a histórias, livros etc. No entanto, aprender a falar é uma coisa que fazemos, de modo geral, sem muitas dificuldades e espontaneamente, isso é sem a necessidade de uma escola, mas para aprender a ler e escrever precisamos sim de uma escola ou de alguém que nos facilite essa aprendizagem, ensinando como funciona o sistema alfabético. É importante frisar também, que embora as crianças de 5 anos possam corrigir frases erradas como “O menina chutou a bola” dizendo que o correto são “A menina chutou a bola”, elas não sabem explicar o porquê a frase estava errada. Isso significa que elas adquirem conhecimentos implícitos da língua oral, mas para aprender a ler e escrever é preciso refletir sobre a língua, é preciso adquirir conhecimentos explícitos.

Quais são as habilidades necessárias para aprender a ler e escrever?

Para aprender a ler e a escrever com eficiência é preciso entender que letras representam os sons das palavras faladas. Dessa forma, tratarei aqui de duas habilidades essenciais: o conhecimento alfabético e a consciência fonêmica (e consciência fonológica). Essas duas habilidades têm sido reconhecidas em inúmeras pesquisas como dois dos melhores preditores do sucesso na alfabetização.

Conhecimento Alfabético

Embora possa parecer a você leitor proficiente que conhecer letras seja algo trivial, que se aprenda espontaneamente sem qualquer dificuldade, isso não passa de uma mera ilusão. É preciso ensinar as crianças a reconhecer o nome, a forma e os sons das letras. Essa deve ser uma das bases da alfabetização e é o que denominamos de conhecimento alfabético.

Para conseguir ler com eficiência as palavras dentro e fora de um texto, nós precisamos ler as palavras por reconhecimento automatizado. Isso significa que nós lemos as palavras com rapidez e precisão porque elas foram armazenadas previamente na nossa memória e a maneira mais eficaz de isso ocorrer é criando conexões entre letras e sons.

As crianças não podem simplesmente descobrir espontaneamente algo que foi inventado há mais de 3000 anos. Isso é, não podem descobrir por que símbolos arbitrariamente significam determinados sons ou o porquê quando se desenha “d” é diferente desse símbolo “b” ou deste “q” ou deste “p”. Deve-se reconhecer que historicamente se convencionou que esses símbolos em posições distintas representam sons distintos, então é preciso ensinar quais os nomes, as formas e os sons desses símbolos chamados letras.

Consciência Fonológica

Outra habilidade fundamental para aprender a ler e escrever é a que chamamos de consciência fonológica. Trata-se da habilidade de prestar a atenção e conseguir manipular intencionalmente os sons que compõe as palavras faladas. Quando nós ouvimos uma frase, não é possível perceber os espaços existentes entre as palavras, nós ouvimos sons coarticulados. Pessoas alfabetizadas passam a perceber os limites entre as palavras dentro de uma frase falada, mas isso é um efeito psicológico. Quando passamos a prestar atenção nesses intervalos de espaço entre as palavras começamos a desenvolver a consciência da palavra, que é um dos níveis de consciência fonológica. Ulteriormente, passamos a prestar a atenção em segmentos sonoros menores como rimas, sílabas e a principal unidade sonora que são os menores sons das palavras, chamados de fonemas.

Cabe destacar que não necessariamente nós desenvolvemos todos esses níveis de consciência fonológica naturalmente se não formos ensinados para tanto. Por esta razão evidencia-se mais uma vez que é preciso ensinar essas habilidades, o que pode ser feito de modo muito simples por meio de jogos e outras atividades lúdicas na Educação Infantil.

Ora, é essencial desenvolver a consciência fonêmica, ou seja, a capacidade de perceber que dentro de cada palavra falada existem pequenos pedaços de sons que são diferentes. A consciência fonêmica (ou consciência dos fonemas) é fundamental para a alfabetização, pois permite que a criança observe que para cada som deve-se usar uma ou mais letras (refiro-me aos dígrafos como CH). Juntamente com o conhecimento alfabético, a consciência dos fonemas permite que as crianças adquiram o que se chama de mapeamento ortográfico que é a forma como nós armazenamos palavras eficazmente na memória, criando conexões entre letras e sons.

Para concluir, retomo a defesa de que a deve-se ensinar a ler e a escrever desde sempre. Não existem evidências de que as crianças só conseguem lidar com letras e sons aos 7 anos, o que existe são evidências de que mesmo crianças muito mais jovens podem aprender a ler se elas conhecem as letras e seus sons. O que realmente importa, em se tratando de alfabetização, é o conhecimento e o uso que as crianças fazem das letras e seus sons. Uma questão que faço aos críticos é quais são os reais prejuízos de se ensinar letras e sons para as crianças? As minhas experiências sempre me mostraram que na realidade as crianças, mesmo as mais jovens gostam muito de saber o que são as letras e como usá-las para dizer coisas. Não é preciso tratar o assunto da alfabetização como algo difícil e cruel, basta reconhecer que com atividades simples é possível estimular e ensinar as crianças, desde muito cedo, a conhecer letras e seus sons. Não apenas a minha opinião, mas as evidências científicas mostram que esses conhecimentos vão ajudar e muito as crianças a aprender a ler e escrever com mais sucesso e prazer.

Conteúdo autorizado para reprodução na Revista Materlife com a fonte retida pelo publicador.

Divulgado em: Prof. Dr. Renan de Almeida Sargiani, Psicólogo CRP 06/109086, Doutor em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano pela Universidade de São Paulo – www.psicologiaexplica.com.br

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